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O que colocar no lugar?

Antônio Carlos, um confrade do movimento espírita de Leopoldina, era capitão da PM mineira e tinha como auxiliar direto um cabo que, na condição de evangélico, possuía uma profunda e inabalável fé nos textos bíblicos.

Certo dia, conversavam a respeito de algumas passagens da Bíblia que Antônio rejeitava por considerá-las racionalmente absurdas. Particularmente, a citação do livro de Jonas, em que esse personagem ficara três dias na barriga de uma baleia.

Antônio argumentou que é impossível a um homem passar pela garganta da baleia, que é estreita demais. Para começar, as baleias não comem nada tão grande como um ser humano. A dieta delas é meio sem graça, na real. Elas filtram o alimento da água e comem basicamente pequenos peixes ou crustáceos que fazem parte do zooplâncton. Por isso, uma baleia não abriria a boca para engolir uma pessoa. Mesmo se tentasse, não iria conseguir. Nem o maior exemplar da maior das baleias, a baleia-azul, conseguiria engolir uma pessoa inteira.

O cabo ouviu atentamente as explicações do Antônio e, encerrando o assunto, afirmou enfaticamente:

– Pois bem, capitão, se a Bíblia dissesse que foi Jonas que engoliu a baleia, ainda assim eu acreditaria.

Temos, no relato anterior, a caracterização da fé tal qual é alimentada pelas religiões tradicionais. Basta crer! É preciso crer! Isso, independentemente de qualquer coisa.

Acho graça da história de um garotinho que, ao chegar em casa após o culto dominical da sinagoga, é interpelado pela mãe:

– E aí? Como foi lá? O que o rabino ensinou hoje?

– Hoje aprendemos sobre a fuga de nosso povo do Egito.

– Ah, que legal! Como foi?

– Foi assim: Moisés chegou diante do Mar Vermelho, e logo atrás vinha o Faraó e seus soldados. Moisés, então, tirou da sacola seu celular e deu um telefonema. De repente, chegou a força aérea de Israel e dizimou os exércitos do Faraó. Logo depois, veio a marinha de Israel e construiu pontes móveis pelo Mar Vermelho, e todos puderam atravessar.

A mãe, suspeitosa, indagou:

– Mas foi assim que o rabino lhe explicou?

E ele:

– Não foi bem assim, mãe, mas, se eu lhe contasse do jeito que o rabino falou, a senhora não ia acreditar.

Deixando de lado a brincadeira e falando sério, considerar a fé das pessoas como sendo algo importante e, às vezes, essencial às suas vidas é algo que precisamos considerar seriamente. Muitas pessoas suportam as agruras da vida e conseguem se conter ante possíveis atitudes altamente indesejáveis por causa de sua fé. E nunca saberíamos o que seria delas sem a fé que dá sentido à sua existência. O homem é fraco demais e a vida dura demais para que a gente possa se permitir desprezar a fé de quem quer que seja. Destruímos a fé de uma pessoa; saberemos colocar outra coisa em seu lugar?

Ricardo Baesso de Oliveira

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