Juízos
“(…) quem me nomeou juiz ou encarregado de vossas partilhas?” Jesus (Lucas 12:14)
Alguém, no meio da multidão, pede a intervenção de Jesus em um problema de herança. A resposta do mestre, reproduzida acima e seguida por um comentário acerca da ganância, tem sido usada como mais um argumento contra a abundância das posses.
Mas, como em tudo que Jesus falou, podemos buscar um sentido mais profundo. A recusa dele em assumir a posição de juiz em uma questão material poderia servir de alerta para nós. De que forma?
Sabemos que é natural buscar o auxílio daquele que consideramos mais inteligente, mais culto ou mais sábio, como é natural esperar que aqueles que assumem a posição de juízes, no mundo, desenvolvam estas qualidades. A vida na sociedade material estará repleta dessas questões, em especial quando os valores morais não são considerados e precisamos de alguém que ajude a resolvê-las.
O Evangelho, porém, parece apontar em outra direção. “Não julgueis para não serdes julgados”, “eu a ninguém julgo”, “nem eu te condeno” (à mulher adúltera) são algumas expressões atribuídas a Jesus.
Apesar disso, não custou muito para que a ideia de um “juízo final” fosse introduzida no pensamento cristão e registrada, por exemplo, em Mateus 25:31-34. Um julgamento externo, conduzido pelo próprio Jesus, separando “bodes e ovelhas”. Uma ideia estranha, pois afinal ele também teria dito que nenhuma de suas ovelhas se perderia. No entanto, essa alegoria é explicada facilmente no Espiritismo (1).
O alerta então é este: não deveríamos usar Jesus ou os Evangelhos para justificar nossos julgamentos humanos, em especial em questões essencialmente materiais. Nossos julgamentos ainda são falhos, influenciados por questões sociais, culturais e individuais. Ao invés de querer trazer Jesus para o “nosso lado” da questão, esperando que ele apoie a “nossa causa”, somos nós que precisamos aprender a apoiar a “causa dele”.
- O Livro dos Espíritos, Allan Kardec. Questão 1010.
Ely Edison Matos
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